domingo, 20 de setembro de 2009

Curitiba: Capital do carro vai ficar a pé



Na próxima terça-feira, Curitiba, a cidade com o índice de motorização mais alto do país (um carro para cada 1,67 habitante), terá a rotina alterada. Será o Dia Sem Carro. Das 6 às 20 horas, as principais ruas do centro da cidade serão bloqueadas. Em vez de carros, o asfalto será espaço para uma série de atividades de lazer, serviços para a população e até o inédito ciclotáxi. E isso é só uma parte da programação prevista para 22 de setembro. A ideia é fazer o curitibano refletir sobre como tornar a cidade mais sustentável do ponto de vista do transporte urbano e da redução de emissão de poluentes. E no dia 23? Tudo como antes?

Para o consultor especialista em trânsito J. Pedro Corrêa, a adesão a esse tipo de iniciativa já é um começo, mas são significa mudança. “Não é um dia de campanha específica, ou alguns dias, que vai resolver. Precisamos de programas permanentes, com ações de longo prazo e objetivos bem definidos”, afirma. Segundo ele, ao fim de campanhas efêmeras, a tendência é que se volte ao mesmo patamar de antes. “Se não houver um trabalho contínuo, sistemático e orientado, vamos fracassar. O que ilumina uma casa são as velas constantemente acesas”, diz.
O trânsito é uma discussão contemporânea nos quatro cantos do mundo. Para Curitiba, especialmente, é um desafio. Mesmo com uma infraestrutura urbana reconhecidamente bem planejada, os problemas no trânsito são evidentes. Oferecer uma estrutura viária adequada e suficiente para todos é uma tarefa quase olímpica para os gestores de trânsito. É que a cada ano nascem mais carros que bebês em Curitiba – só neste ano foram 130 veículos a mais por dia nas ruas, o dobro do número de crianças nascidas a cada dia no mesmo período.

Em julho deste ano, a frota curitibana bateu a marca de 1.125.866 carros, crescimento 2,55% em relação ao ano passado. Para “abrigar” todos esses carros, Curitiba conta hoje com 4,7 mil quilômetros de vias, e mesmo assim não tem tempo de parar para tomar fôlego. “Quan­to mais se facilita o trânsito, mais se oportuniza espaço para o carro. Mas temos de criar ações. Não dá para fechar os olhos para o número de carros que são jogados nas ruas todos os dias”, afirma Rosângela Batis­tella, diretora de trânsito da Urbs, empresa responsável pelo gerenciamento do trânsito e do transporte coletivo na capital.

A infraestrutura viária é, ainda, apenas uma das variáveis dessa equação. A vida humana é uma das partes mais importantes da fórmula. Em média, 20 pessoas ficam feridas no trânsito ao fim de um dia em Curitiba e uma pessoa morre a cada seis dias. Os números eram ainda mais trágicos no ano passado, quando o número de feridos e mortos no trânsito, no mesmo período de comparação, de janeiro a julho, foi 30% e 52% maior, respectivamente. Em média, registra-se um acidente de trânsito a cada 22 minutos.

Tantos acidentes, feridos e mortes viraram um problema de saúde pública. Um grupo de pesquisadores do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo realizou um estudo para levantar informações sobre as consequências econômicas do problema e chegaram à conclusão de que o custo médio da internação hospitalar de um acidentado de trânsito é de R$ 47,5 mil. O valor pode aumentar se o paciente precisar de internamento em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), o que acontece em 18% dos casos. O tempo médio de internação na UTI é de 32 dias, com um gasto de R$ 226 mil por paciente.

A ideia do Dia Sem Carro é justamente fazer o curitibano refletir sobre todas essas questões e, de quebra, incentivar o uso do transporte coletivo e de outros meios, como a bicicleta. “Nesse dia fazemos ações para que as pessoas coloquem a mão na consciência e façam uma reflexão sobre os seus deslocamentos”, explica Rosângela. “O ideal é que as pessoas fizessem isso todos os dias. Não que sejamos contra o veículo, mas ele tem de ser usado de forma racional”, completa a diretora de trânsito, que prefere ir ao trabalho de ônibus. “De carro levo 25 minutos, de ônibus são 15”, conta.

O Dia Sem Carro é apenas parte das comemorações da Semana do Trânsito, que começou dia 18 e vai até sexta-feira. No Brasil, estima-se que outras 24 cidades vão participar da campanha do Dia Sem Carro. Curitiba adere ao movimento pela terceira vez e dessa vez conta com a participação da Rede Paranaense de Co­­municação (RPC), da Fund­ação O Boticário, do Clube de Criação do Paraná e do Grupo Transporte Humano.

Na capital paranaense, em especial para o dia 22 de setembro, uma frota extra de 100 ônibus será colocada na rua para atender à população. O trecho mais central da Avenida Marechal Deodoro, entre a Rua João Negrão e Avenida Marechal Floriano, por onde passam cerca de 3,3 mil carros em horários de pico, será bloqueado. Os acessos à Praça Ti­­radentes e à Rua Barão do Rio Branco no trecho entre o Paço Municipal e a Rua André de Bar­ros, também estarão fechados.

No lugar dos carros, as ruas vão abrigar atrações artísticas, feira de produtos orgânicos, jogos, brinquedos, atividades de educação de trânsito, artesanato, exames de saúde, entre outros. Apenas ônibus, bicicleta, pessoas a pé e veículos de serviços essenciais e de emergência terão acesso aos trechos interditados. E não será só no Centro que haverá atividades do Dia Sem Carro. Teatros, exposições, distribuição de plantas, caminhadas, jogos gigantes, serviços de saúde e ruas fechadas também estão programados para os bairros.
(Gazeta do Povo)

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