Além de revolta e tristeza, o acidente com o ônibus 5382 da Unesul — que matou seis pessoas e deixou 27 feridas — traz à tona um debate que já não pode ser adiado. Por lei, o uso do cinto de segurança não é obrigatório nos veículos que fazem o transporte intermunicipal na modalidade "comum" — o famoso pinga-pinga. A questão é se não seria o caso de mudar as regras?
Autoridades são unânimes ao afirmar que o dispositivo de segurança poderia ter feito a diferença na tragédia em Glorinha, na tarde de terça-feira. Embora as poltronas do coletivo tivessem cinto, a maioria não utilizava o equipamento.
Se a falta de conscientização é um problema, a legislação também deixa a desejar. O recurso não é exigido nesse caso por distintas razões. Primeiro, porque os ônibus pinga-pinga são autorizados a levar passageiros em pé. Segundo, porque percorrem distâncias menores, fazem paradas e, teoricamente, circulam em baixa velocidade.
Nada disso, na avaliação do chefe de comunicação da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Alessandro Castro, justifica a omissão. O agente diz que a PRF defende uma mudança radical e urgente na legislação.
— O uso do cinto deve ser obrigatório em todos os ônibus, e os passageiros devem ser responsabilizados caso desobedeçam, não o motorista. Se doer no bolso, ninguém vai deixar de usar. E mais: as viagens em pé precisam acabar — sintetiza Castro.
Ninguém discorda de que a segurança deve vir em primeiro lugar, mas o professor de transporte e trânsito da Unisinos João Hermes Junqueira faz uma ressalva. Na prática, a alteração viria acompanhada de alguns efeitos indesejados. Seria necessário que a sociedade abraçasse a causa.
— Se fosse proibido transportar passageiros em pé, as companhias teriam de colocar mais ônibus em circulação. Isso acarretaria em aumento nos custos e, consequentemente, nas tarifas — diz Junqueira.
O assessor da presidência do Sindicato das Empresas de Transportes Rodoviários do RS, Gilberto Toigo, engrossa a lista de restrições. Ele estima que a medida resultaria em um aumento de pelo menos 25% da frota em uso, o que contribuiria para entupir o sistema viário.
— Somos parceiros para mudar, desde que o objetivo seja apenas exigir o uso do cinto. Quanto a coibir o transporte em pé, consideramos inviável — afirma Toigo.
Coordenador da Frente Parlamentar em Defesa do Trânsito Seguro, o deputado federal Hugo Leal (PROS-RJ) diz que está disposto a discutir o tema no Congresso.
— Só acho que mudar as normas não seria a solução. De nada adianta aumentar o rigor se não houver fiscalização — resume Leal.
O responsável pelo Comando Rodoviário da Brigada Militar, coronel Fernando Alberto Moreira, complementa: a decisão de usar ou não o cinto de segurança continuaria sendo do passageiro — e da sua consciência.
O que diz a legislação
-A resolução nº 14, de 1998, do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), diz que o uso do cinto não é obrigatório no caso dos ônibus nos quais é permitido transportar passageiros em pé.
-A resolução nº 5.755, de 2014, do Conselho de Tráfego do Daer, regulamenta o transporte de pessoas em pé nos ônibus da modalidade "comum" (pinga-pinga), limitando o número de passageiros e a extensão que eles pode percorrer sem sentar (até 75 km).
Fonte: Zero Hora
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